sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Coco no cabelo, casca no churrasco


Coco no cabelo, casca no churrasco

Liana John - O Brasil já sofre os efeitos do anunciado “apagão florestal” decorrente do descompasso entre a crescente demanda por produtos madeireiros e o plantio insuficiente de florestas para exploração. Isso inclui a produção de carvão vegetal para fins comerciais, industriais, rurais e domésticos: de acordo com o Plano Nacional de Agroenergia 2006-2011, elaborado pela Embrapa, estima-se que 3 milhões de hectares de eucaliptos sejam exclusivamente dedicados à transformação em carvão vegetal, a cada ano. E ainda tem a lenha das padarias, pizzarias e outros negócios movidos a fornos caseiros; a madeira dos móveis, pisos, telhados e construções; a celulose do papel e assim por diante.

Só o consumo industrial de carvão vegetal – com destaque para siderúrgicas emetalúrgicas – fica em torno de 45 milhões de metros cúbicos por ano. E ainda tem o churrasco de fim de semana, que leva pouquinho carvão de cada vez, porém é multiplicado por 190 milhões de brasileiros…
O cômputo do produto clandestino – roubado das nossas matas e queimado à custa de trabalho degradante – é bem difícil de fazer. Mas o mesmo estudo da Embrapa estima que 72% do carvão vegetal sejam provenientes de florestas plantadas e 28%, de florestas nativas, em todo o país.
Não é preciso fazer muita conta para concluir que precisamos de alternativas energéticas para – a um tempo – escapar do “apagão florestal” e eliminar de vez a conversão de vegetação natural em aço, ferro-gusa ou churrasco, seja no Cerrado, na Caatinga ou em qualquer outro bioma. Neste contexto, é bom assoprar a brasa de estudos comparativos como o realizado pelo engenheiro florestal José de Castro Silva, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), e os pesquisadores Luiz Ernesto George Barrichelo José Otávio Brito, ambos da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP).
Eles avaliaram o desempenho do carvão vegetal de eucalipto (Eucalyptus grandis) e do carvão feito com as cascas (endocarpo) de dois coquinhos bem brasileiros: o debabaçu (Orbignya phalerata) e o de macaúba (Acrocomia sclerocarpa). “O carvão dos coquinhos não sacrifica a planta e há notícias de palmeiras com 150 anos ainda produzindo e prestando serviços à natureza”, observa Castro Silva. Mas não é só: na ponta do lápis, o carvão dos coquinhos também é mais eficiente. Muito mais eficiente.
“Usamos fornos semelhantes aos de siderúrgicas e metalúrgicas para a comparação, mas no uso doméstico o carvão de coquinhos também é superior: enquanto o carvão de eucalipto produz calor durante uma hora e meia a duas, a mesma quantidade de carvão de babaçu ou de macaúba produz calor durante 6 horas”, afirma o engenheiro florestal. E detalha: “O endocarpo dos coquinhos é bem mais denso, quer dizer, tem mais massa para o mesmo volume. Ele queima mais devagar e produz mais calor, além de emitir menos material volátil (fumaça) e gerar menos cinzas”.
Nos cálculos de área ocorre um empate, apesar dos eucaliptos contarem com muito investimento em pesquisas de produtividade, enquanto os babaçuais e os macaubais explorados ainda são os nativos (investimento zero). Existem pouquíssimos plantios comerciais dessas palmeiras, apenas começando em Minas Gerais Mato Grosso. A domesticação ainda está longe de ser realidade.
Mesmo assim, conforme o estudo da UFV e Esalq, o calor produzido por um hectare de eucaliptos transformado em carvão equivale ao calor produzido por um hectare de carvão de babaçu ou macaúba. A diferença é que o eucalipto é cortado e as palmeiras são mantidas em pé.
Quando, enfim, se olha para o valor agregado, a balança pende para as palmeiras, pois o eucalipto transformado em carvão não pode virar móvel, ou viga ou nenhum outro produto, enquanto o carvão de coquinho é obtido só com as cascas, após a retirada das amêndoas para a obtenção de óleo, o principal produto tanto do babaçu como da macaúba.
Os dois óleos têm uso alimentíciofarmacêutico cosmético, sobretudo na fabricação de sabonetes xampus de excelente qualidade. “No Paraguai já existem grandes plantações de macaúba, gerenciadas por franceses e totalmente voltadas para a exportação do óleo para a Europa, para a indústria cosmética”, conta José de Castro Silva. As cascas são consideradas subproduto. No Brasil, o carvão de babaçu já é comercializado no Maranhão Piauí, mas o de macaúba ainda não chegou ao mercado.
Então, para estimular a mudança no padrão de consumo, vocês já sabem: no próximo fim de semana ou feriadão, quero ver toda a família de cabelo lavado, catando cascas de coquinhos para saborear um churrasco mais sustentável! E bom apetite!

Foto: Liana John (cacho de macaúba)

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