sexta-feira, 9 de março de 2012

Más condições de trabalho afetam saúde dos policiais

Informe ENSP - Más condições de trabalho afetam saúde dos policiais


Isto nem é novidade, só é a confirmação científica do que a sabedoria popular já observou ha tempos!








A greve de policiais civis e militares e de bombeiros na Bahia - e uma tentiva frustrada no Rio de Janeiro - parece ser fruto de um processo histórico que vem desgastando a credibilidade desses profissionais junto à população - por meio da formação de uma imagem de ineficácia da sua atuação e de uma atuação corrupta - e também pelo desgaste da crença desses profissionais na possibilidade de obter condições dignas de trabalho, com melhores salários, equipamentos adequados, melhor formação e atenção aos seus problemas de saúde. A análise da crise foi feita pela pesquisadora do Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (Claves/ENSP/Fiocruz) Edinilsa Ramos de Souza, que, em parceria com as pesquisadoras Maria Cecília de Souza Minayo e Patrícia Constantino, vem desenvolvendo estudos a fim de investigar os impactos das condições de trabalho no processo de adoecimento e morte dos policiais, com ênfase naqueles que atuam nas unidades operacionais, desempenhando atividades nas ruas e enfrentando as dificuldades do cotidiano de criminalidades.

Um dos resultados dessas pesquisas é o livro Missão prevenir e proteger, elaborado para suprir uma carência bibliográfica em estudos sobre segurança pública. A publicação é resultado de um trabalho sociológico que investigou as condições de trabalho, saúde e qualidade de vida dos policiais militares do estado do Rio de Janeiro. O livro procura oferecer um entendimento sobre a natureza da função da Polícia Militar na sociedade através da análise de sua história, sob o aspecto de seus antecedentes, sua instituição e institucionalização, seus integrantes e suas funções legais, no passado e no presente. Além disso, avalia também as consequências das condições de trabalho impostas ao policial militar com o objetivo de produzir informações que ultrapassem preconceitos alimentados, durante décadas, com ressentimentos entre policiais e cientistas da área de humanidades, permitindo a pluralidade e a relativização das verdades defendidas por cada um, a partir de suas subjetividades.

Segundo Edinilsa, o assunto tomou proporções vultosas e ganhou repercussão na mídia de todo o País por conta da greve na Bahia. Atualmente, há uma linha de pesquisa no Claves/ENSP especialmente voltada para essa classe de profissionais. A pesquisadora explicou que o interesse nesse grupo surgiu de uma pesquisa feita com adolescentes. Na ocasião, eles apontaram problemas e dificuldades na relação com policiais. A partir daí, o Claves/ENSP transferiu o foco de seus estudos a esses profissionais, no lugar da instituição policial, até então alvo da maior parte dos estudos sociológicos na área de segurança pública. Em entrevista ao Informe ENSP, Edinilsa explica que, ao escutar esses profissionais, descobriu-se um grupo carente em vários aspectos da vida laboral, como formação e condições dignas de trabalho, mas também de atenção especializada à saúde física e mental.

Informe ENSP: De que maneira a crise nas duas esferas da Polícia se relaciona com as condições de vida, trabalho e saúde desses profissionais?

Edinilsa Ramos:
 A crise parece ser fruto de um processo histórico, de longa data, que vem desgastando, tanto a credibilidade externa desses profissionais junto à população, por meio da formação de uma imagem de ineficácia da sua atuação e de uma atuação corrupta, como pelo desgaste da própria crença deles na possibilidade de obter condições dignas de trabalho, dentre as quais podemos citar melhores salários, equipamentos adequados, melhor formação para o desempenho das suas funções, atenção aos seus problemas de saúde. Esta crise é a reivindicação de todas essas questões, que há muito vêm sendo apontadas, mas que até agora não foram suficientemente ouvidas e contempladas pelas autoridades e pelas políticas públicas dirigidas a essa categoria. E, como o trabalho é uma dimensão estruturante da vida humana, a eclosão de uma crise nessa esfera afeta as demais dimensões, sobretudo a saúde e a vida como um todo. Certamente, os envolvidos direta ou indiretamente com os conflitos que estamos acompanhando pela mídia podem padecer de seus efeitos na forma de aumento da pressão arterial, taquicardia, insônia, falta de apetite, sentimentos de ansiedade, angústia, medo e sofrimento mental, dentre outros sinais e sintomas.

Informe ENSP: Qual foi o objetivo da pesquisa Condições de trabalho, saúde e qualidade de vida dos policiais civis e militares da cidade do Rio de Janeiro: estudo comparativo?

Edinilsa Ramos:
 O objetivo do estudo foi realizar um amplo panorama sobre as condições de trabalho, de saúde e de qualidade de vida desses profissionais que atuam na capital do estado do Rio de Janeiro. O tema dá continuidade às diversas pesquisas e projetos realizados em prol do processo saúde e doença dos policiais de todas as categorias. Foram pesquisados 1.458 policiais civis e 1.120 policiais militares de amostras representativas dos efetivos de cada uma das corporações. Os policiais responderam a um questionário contendo 124 questões, para a Polícia Civil, e 107 questões para a Polícia Militar. Foram utilizadas duas escalas estruturadas e validadas no Brasil: Escala de Apoio Social, que possui 19 itens, sendo constituída de cinco dimensões: Emocional (compreensão dos seus problemas por outrem); Informação (recebimento de sugestões, bons conselhos e informação); Material (ajuda nas tarefas diárias caso fique doente); Afetiva (demonstração de afeto e amor); Interação positiva (diversão em conjunto com outros); e a Escala Self Report Questionnaire (SQR20), que mede a existência de distúrbios psiquiátricos menores ou sofrimento psíquico - depressão leve, ansiedade e agravos psicossomáticos, como dores de cabeça, insônia, entre outros, causados por distúrbios psicológicos.

Informe ENSP: Como esses dados foram processados?

Edinilsa Ramos:
 Os dados foram processados cumprindo-se quatro etapas: codificação, digitação, crítica da digitação e consistência. Foi efetuada, inicialmente, uma análise exploratória em que as duas corporações foram comparadas em relação a todas as questões. Para avaliar os resultados, foi usada também a técnica de Regressão Logística, que consiste em fazer uma modelagem para analisar a vitimização dos policiais, que incluiu seis questões dicotômicas: ferimento por projétil de arma de fogo, ferimento por arma branca, agressão física, violência sexual, tentativa de suicídio e tentativa de homicídio.

Informe ENSP: Que resultados o estudo apresentou?

Edinilsa Ramos:
 Os resultados do estudo comparativo entre as duas corporações mostraram que, no que se refere ao perfil sociodemográfico, em quase todos os itens do questionário, os policiais militares ficam em desvantagem em relação aos civis. Do ponto de vista do processo de trabalho, os policiais militares se queixam muito do excessivo peso da hierarquia e da disciplina. Sobre os problemas de saúde, dentre os mais preocupantes nas duas corporações estão o excesso de peso e a obesidade, as enfermidades gerais relacionadas à saúde física, mas, sobretudo a problemas mentais, como sofrimento psíquico e estresse, o que aponta para a necessidade urgente de se instituírem formas eficazes e bem elaboradas de apoio psicológico e a melhora nos serviços de assistência. A imagem dos policias é apontada por eles mesmos como bastante degradada. Segundo a sua visão, tanto a sociedade como as próprias corporações têm uma visão negativa do policial e não o valorizam. Mesmo assim, na maioria dos questionários, quando perguntados se escolheriam outra profissão, uma parcela significativa disse que não, mas que gostaria de melhores condições de trabalho.

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