Profissionais de sustentabilidade buscam orientação fora da empresa
SÃO PAULO - O tema sustentabilidade já é pauta em um número considerável de grandes empresas, mas as dúvidas na hora de traduzir as ideias em ações ainda são fonte de muita discussão. Apesar de a vontade para desenvolver projetos na área existir, ela muitas vezes não é suficiente para tirar as sugestões do papel. Mas iniciativas que reúnem profissionais de diferentes companhias mostram que uma ajuda externa pode ser a resposta para os funcionários que querem dar início a projetos desse tipo dentro de grandes organizações e não sabem por onde começar.
O espaço Hub, em São Paulo, costuma ser local de encontro e trabalho para profissionais freelancers e empreendedores, mas também possui entre seus clientes fixos funcionários de grandes empresas que usam o espaço para trabalhar remotamente. Pelo contato com essas pessoas, o professor da escola de negócios Fundação Dom Cabral (FDC) Heiko Spitzeck, o criador do Hub, Pablo Handl, e Ana Biglione, responsável pelo desenvolvimento de processos formativos, perceberam uma vontade comum de desenvolver um ambiente para debater ideias relacionadas à sustentabilidade e causas sociais. A motivação veio de um descontentamento com a falta de espaço para discutir projetos dessas áreas nas grandes organizações.
“A maioria dos funcionários das grandes empresas não tem vontade suficiente para empreender um negócio próprio e alguns estão conscientes que fica mais fácil alcançar o impacto desejado quando se faz parte de uma grande companhia”, explica Spitzeck, que em outubro do ano passado voltou de uma viagem à Inglaterra, onde estudou o tema intraempreendedorismo – termo cunhado pelo americano Gifford Pinchot III na década de 80 que significa empreender e incentivar a inovação dos funcionários dentro das empresas.
Assim surgiu um projeto piloto liderado por Handl, Spitzeck e Ana. Foram cinco encontros entre outubro e dezembro do ano passado com dez profissionais de empresas como Google, Natura, Johnson & Johnson e Danone. Com diversos níveis de experiência, os participantes possuem o mesmo objetivo: identificar os melhores meios de promover mudanças em direção a um mundo mais sustentável, com ideias nascidas dentro das organizações.
Ao longo do período, os funcionários compartilharam experiências e ideias a fim de conhecer casos que deram certo, desenvolver estratégias e até discutir a melhor forma de abordar um projeto novo com o chefe. Ao fim dos encontros, cada participante apresentou uma ideia de sua autoria, com a promessa de que o próximo passo seria levá-la ao conhecimento da empresa.
Gerente de sustentabilidade da Danone, Lucas Urbano foi convidado por conhecidos a participar do grupo para compartilhar suas experiências bem-sucedidas na empresa, na qual entrou em 2008 como trainee. Para o engenheiro ambiental, que passou a fazer parte da área de sustentabilidade quando ela começava a se desenvolver na Danone Brasil, a troca de experiências com pessoas de outras empresas foi um ponto forte do projeto. “É muito importante ver como o assunto é abordado em outras companhias e como outros profissionais lidam com conflitos relacionados ao tema”, explica.
Na Danone, Urbano fez parte de um projeto que mudou 96% da matriz energética da fábrica para fontes renováveis e agora desenvolve uma parceria com o Instituto Nenuca de Desenvolvimento Sustentável e o Movimento Nacional dos Catadores. A meta é construir uma rede de cooperativas de catadores de lixo reciclável em Poços de Caldas e Jacutinga, no sul de Minas Gerais. Lançado em novembro, o projeto foi desenvolvido a partir de oito meses de discussões com os catadores e membros das comunidades da região, onde a Danone possui plantas, e beneficiará 24 cooperativas já existentes.
Urbano acha que as organizações já entendem que ações desse tipo são uma oportunidade de negócio e estão dando mais espaço para intraempreendedores apresentarem suas ideias sustentáveis. “O desafio do profissional da área é fazer esse espaço crescer”, explica. Apesar das reuniões do programa de intraempreendedorismo terem acabado, Urbano diz que o grupo mantém o contato pela internet. Spitzeck e Handl pretendem dar continuidade ao projeto em 2012 e querem ampliar o círculo de envolvidos (interessados em participar podem escrever para o intraempreendedorismo@gmail.com).
Realizado desde 2007, o Café com Sustentabilidade também busca reunir, em São Paulo, profissionais de diferentes empresas para debater questões ligadas ao tema. A sócia-fundadora da consultoria Apoena Sustentável e idealizadora do encontro, Andrea Goldschmidt, diz que teve a ideia quando percebeu que muitos dos clientes que chegavam à empresa com intenção de desenvolver projetos na área compartilhavam das mesmas dúvidas e desafios. Com dez encontros por ano em grupos de 20 pessoas, hoje o Café atrai uma mistura de profissionais que já desenvolvem trabalhos na área e iniciantes que possuem dúvidas de como começar.
Cada café da manhã, promovido toda terceira quarta-feira do mês, aborda um tema estratégico para o assunto sustentabilidade e promove a apresentação de um caso relacionado ao tema. Muitos participantes repetem a dose e mantêm contato ao longo do ano, mas Andrea reforça que os encontros vão além do networking. “A ideia é discutir os temas e construir conhecimento entre empresas de diversos segmentos”, explica. O Café mantém um blog para divulgar o material dos encontros passados. Ali, é possível entrar em contato para participar da iniciativa.
A coordenadora de responsabilidade social do Santander, Emanuelle Magno, participou de três encontros no ano passado, como ouvinte e apresentando casos do banco. Para ela, a troca de experiências com profissionais tanto de organizações do mesmo segmento quanto de outras áreas do mercado é essencial para se manter atualizada no assunto. “Os temas tratados são diversos e de vanguarda e sempre aprendemos coisas novas”, diz. “Quando possibilitam avanços das nossas práticas, aplicamos na empresa."
(Letícia Arcoverde / Valor)
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